A Secretária de Goiás, Raquel Teixeira, confirma que 25% das 1.000 escolas públicas serão administradas por organizações sociais – e não 30% como anunciado antes. Ela, como é praxe nas justificativas de privatização, diz que:
“Não é privatização, pois não vamos perder o controle da escola, não vamos entregar para um ente privado e ele não vai ter lucro. Também não é terceirização, é uma parceria”.
A Secretária diz ainda que:
“O modelo irá beneficiar os docentes temporários. Hoje eles têm contrato precário e recebem cerca de R$1.300, mas, caso sejam selecionados, serão contratados pela CLT e receberão piso de 2.400 reais se tiverem formação adequada.”
É assim que se tenta tornar mais simpáticos os primeiros momentos da privatização, para vencer resistências. Eis a maneira pela qual os reformadores lidam com “conceitos ad hoc” e desculpas para privatizar.
Primeiro, dizem que entregar escolas para OS, não é privatizar. Para eles, como a escola não foi “vendida” e ainda é um bem público, então argumentam que ela é pública e não privada. Não admitem outras formas de privatização como a privatização por concessão. Segundo, fazem uma separação entre gestão e educação. Para eles, a gestão pode ser separada facilmente da educação, da parte pedagógica. Uma fica com a OS e outra com a Secretaria que, na visão dela:
“Nosso modelo é uma busca de gestão melhor da escola e da sala de aula. Mas a orientação pedagógica continuará sendo do Estado”.
Mas o professor terá seu trabalho desqualificado por uma série de medidas de controle e apostilamentos feitos pela OS, visando alinhar o que faz em sala de aula com os testes. Na realidade, o diretor não precisa entender da parte pedagógica, pois virá tudo pronto na forma de um sistema pré-fabricado.
A parte hilária da declaração é a relativa aos servidores temporários. Ao invés de abrir concurso e efetivá-los, vai entregá-los às OS para serem contratados pela CLT, ou seja, sem estabilidade no emprego. Continuarão precários, pois poderão ser demitidos a qualquer momento.
No regime CLT, durante algum tempo, pode-se até pagar mais ante a miséria que já recebem hoje, mas o contratado pela CLT não terá acesso aos benefícios dos servidores efetivos. Com o tempo, o reajuste do salário fica por conta das terceirizadas que obviamente reajustarão os salários quando bem quiserem. A rotatividade aumenta e o salário é sempre o inicial. De quebra, não podem ir reclamar no sindicato, pois não são servidores públicos. E se forem, podem ser demitidos.
Nesta exposição da Secretária, fica claro porque a educação de Goiás tem problemas: 30% da rede é temporária e ganha 1.300 reais. Não há que se falar em qualidade num quadro deste e nem se colocar qualquer culpa na escola pelas dificuldades de atendimento que tenha. O dinheiro que podia ser aplicado na melhoria dos salários dos atuais contratados, vai agora para OS.
Fica claro também que a ideia é colocar a atual carreira de servidores em extinção não abrindo concursos e chamando OS para que contratem por CLT. O magistério de Goiás e sua escola pública de gestão pública começam a ser destruídos. Na visão dos reformadores empresariais a estabilidade no emprego é o que torna o professor ineficiente. Lançado ao mercado e podendo ou não ser recontratado pela OS, esta pode escolher os que se ajustam melhor às exigências de ensinar para os testes. Professores concursados, recusam-se a serem desqualificados e terem seu trabalho definido por apostilas e controles externos em função de testes. São profissionais com dignidade que lhes é assegurada pela estabilidade.
De quebra, transferindo os professores para a iniciativa privada, eles deixam de ser considerados servidores do Estado e com isso não contam no teto da lei de responsabilidade fiscal.
Em um quadro precário como o vigente na educação goiana, com 30% de temporários ganhando R$1.300,00, a Secretária não pode exigir muito da rede:
“Achamos que o desempenho está pouco e que não vamos melhorar se continuar como estamos fazendo.”
Sem dúvida. Mas o diagnóstico está errado. Não é a gestão, nem o desempenho que está pouco. São as práticas da Secretaria em relação às condições de trabalho. A escolha da Secretária é pela precarização e intensificação do trabalho via OS, regado a controle e preparação para os testes.
É isso que ocorre quando se coloca como horizonte para a educação o aumento dos índices e não a qualidade da educação. Sonegam-se condições e se quer índices melhores. Como isso é impossível, foca-se na gestão dos índices. Precarizam-se as formas de contrato, controla-se e pressiona-se a rede para ensinar para os testes e, assim, aumentar os índices.
No entanto, índices maiores em testes de Leitura e Matemática não são sinônimos de boa educação. Este é o grande engodo que está sendo vendido aos goianos.
A proposta neoliberal de “reforma” dos serviços públicos, como
se sabe, é orientada por uma idéia reguladora: a idéia de privatizar,
isto é, de acentuar o primado e a superioridade da ratio privada sobre
as deliberações coletivas. Daí suas diferentes maneiras de manifestação.
Privatizar, no sentido estrito do termo, é apenas uma delas: transferir
a agentes privados (empresas) a propriedade e gestão de entes públicos.
Mas há outros modos de fazer valer o mandamento. Pode-se delegar a
gestão, sem necessariamente transferir a propriedade. Pode-se ainda
manter na esfera estatal a gestão e a propriedade, mas providenciando
reformas que façam funcionar os agentes públicos “como se” estivessem
no mercado, modelando o espaço público pelos padrões do privado.
Diferentes modos de descentralização e dispersão de operações – com
a correspondente centralização e o insulamento dos âmbitos de
definição das grandes políticas, das práticas de avaliação de desem-
penho, de distribuição do bolo orçamentário – são pensadas como
formas de introduzir o ethos privado (dinâmico, purificador) do
mercado no reino das funções públicas(MORAES,2002)
REFORMAS NEOLIBERAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS:HEGEMONIA IDEOLÓGICA E REDEFINIÇÃO
DAS RELAÇÕES ESTADO-SOCIEDADE de REGINALDO C. MORAES
Obrigada Prof. Freitas por nos ajudar a divulgar o que está acontecendo no estado de Goiás e assim fortalecer nosso MOVIMENTO CONTRA A TERCEIRIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO ESTADO DE GOIÁS. Um abraço! Sandra Limonta – professora da FE UFG.
A minha dúvida em relação á essa medida de nossa secretária, orientada pelo nosso ‘nobre’ governador é sobre a validade dessas alterações. Na mudança da gestão essas medidas podem ser “resetadas”??
Até o momento não vi menção sobre a validade desses contratos!
Não é fácil de serem revertidas uma vez instaladas… esta medida é uma reforma fiscal e não educacional.
Excelente a iniciativa Professora. PARABÉNS!
Como está claro em todas as falas do VI EDIPE e também neste texto, a terceirização é apenas uma a mais de um pacote de investidas de políticas neoliberais frente à educação pública. Precisamos nos envolver mais e participar de forma ativa desses debates para enfrentarmos tais mudanças.
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