A falta de produtividade (dos outros)…

Que empresário é chorão e gosta de dependurar-se no Estado, até o Levy sabe. E que a Folha de São Paulo é veículo do choramingo da categoria, também não é novidade. Em sua constante tarefa por desinformar em matéria de produtividade,  a Folha volta hoje, em editorial, a responsabilizar a educação pela baixa da produtividade do trabalhador brasileiro (1/4 da produtividade de um trabalhador americano).

A Folha é veículo dos empresários paulistas. Para o empresariado a questão da produtividade (especialmente a dos outros, já que eles mesmos se consideram exemplares e porque pagam impostos estimam que o estado brasileiro é sempre devedor de algo para eles) é central, pois afeta diretamente o lucro. Já falamos sobre isso por aqui a propósito de outros arautos empresariais que a própria folha estimula.

Em seu editorial diz:

“Muitos fatores, naturalmente, influenciam a eficiência do trabalho. Métodos gerenciais aperfeiçoados, treinamento frequente e máquinas mais modernas, por exemplo. Nosso principal calcanhar de aquiles, contudo, está na esfera da educação.”

Desta vez ela assume em editorial e não encomenda. Mas o faz de maneira tendenciosa. A ideia é passar um ícone: educação gera a falta de produtividade brasileira. Na esteira disso, todas as medidas propostas pelo modelo de reforma empresarial da educação estão justificados. Já conhecemos isso.

Mas não custa lembrar aqui o seguinte:

  1. se melhoria do desempenho educacional e produtividade estivessem associadas como acha a Folha, os Estados Unidos seriam um fracasso em termos de produtividade. Sobre isso o leitor por ler aqui.
  2. a Folha omite quais são os componentes que entram no cálculo do índice de produtividade. Dados de 2013 se fossem considerados pela Folha mostrariam algo um pouco diferente.

O Brasil no World Competitiveness Yearbook 2013

2012 2013 2012 2013
Performance Econômica 47 42 Eficiência dos Negócios 27 37
Economia Doméstica 25 31 Produtividade e Eficiência 52 58
Comércio Internacional 56 59 Mercado de Trabalho 17 23
Investimento internacional 30 20 Finanças 28 27
Emprego 6 6 Práticas Gerenciais 20 27
Preços 55 56 Atitudes e Valores 15 32
Eficiência do Gov. 55 58 Infraestrutura 45 50
Finanças públicas 41 45 Básica 50 55
Política Fiscal 37 38 Tecnológica 54 57
Marco Regulatório 55 58 Cientifica 33 36
Legislação dos negócios 55 58 Saúde e Meio-Ambiente 35 35
Estrutura Social 53 55 Educação 54 56

Ou seja, existem variados fatores determinando este índice.

E o que diz o relatório referente ao ano 2014-2015?

 “O Brasil cai uma posição e ocupa a 57ª este ano. Este declínio é impulsionado pela não resolução de sua persistente fraqueza em sua infraestrutura de transporte (77) e uma percepção de deterioração do funcionamento das suas instituições (104), com aumento das preocupações sobre a eficiência do governo (131) e corrupção (130). O Brasil também exibe um fraco desempenho macroeconómico este ano (85), mais um aperto de acesso ao financiamento, e um sistema de educação deficiente (126), que não fornece trabalhadores com o conjunto de habilidades necessárias para uma economia em transição para mais actividades baseadas no conhecimento. “

Portanto, os dados e os relatórios estão longe de responsabilizar a educação como “nosso principal gargalo”. Isso é interpretação tendenciosa da Folha. Tem a infra dos transportes na frente. E convenhamos também que a corrupção não é questão apenas do governo – se tem quem paga, tem quem faz. Um não vive sem o outro. É preciso lembrar que até pouco tempo não havia como penalizar empresas que pagassem propina e só eram penalizados os que recebiam. Sem falar que a ligação da produtividade com a educação não tem esta relação direta, como mostram os dados americanos citados acima.

Os empresários continuarão se queixando de que o Estado não fornece as condições para o aumento de seu lucro, afinal este desejo de aumento é infinito. Mas colocar a conta só na educação, isso é oportunismo para apoiar reformas que visam o controle ideológico da educação.

 

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About Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
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2 Responses to A falta de produtividade (dos outros)…

  1. Avatar de Maria Marcia Sigrist Malavasi Maria Marcia Sigrist Malavasi disse:

    Excelente!

  2. Avatar de M. Estela Sigrist Betini M. Estela Sigrist Betini disse:

    São os amadores falando, sem saber como justificar, tudo vai para a conta da educação. Amadores sobre a Educação, não sabem o que dizem.

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