As milícias virtuais e as forças presenciais bolsonaristas se preparam para elevar o grau de naturalização da segregação social. Pressionadas pelo espectro da crise que poderá suceder à pandemia (saques, paralisação da economia, etc.) o populismo nacionalista reacionário arregimenta as forças do mercado e a classe média em defesa do chamado isolamento vertical (só para velhos e pessoas de risco) de olho na permanência no poder. Com isso, quer evitar que uma crise econômica crie as condições para o retorno do discurso liberal centrista do papel do Estado e do discurso de esquerda em futuras eleições, mesmo que isso custe vidas.
A naturalização da segregação social que vinha se colocando através da ampla defesa da meritocracia em todos os setores, já substituía desigualdades sociais por desigualdades de mérito. O passo adicional será aplicar a mesma lógica meritocrática à sobrevivência pessoal à pandemia.
Neste novo patamar, sobreviver à pandemia é uma questão de mérito pessoal, de ser “responsável” por não contrair o vírus. Diz Bolsonaro:
“Você quer que eu faça o quê? Eu tenho o poder de pegar cada idoso e levar para um lugar? É a família dele que tem que cuidar dele no primeiro lugar”, afirmou Bolsonaro, em entrevista em frente ao Palácio da Alvorada, a residência oficial da Presidência. “O povo tem que parar de deixar tudo nas costas do poder público. Aqui não é uma ditadura, é uma democracia”, declarou. “Os responsáveis pela minha mãe de 92 são seus meia-dúzia [de] filhos”, complementou Bolsonaro.”
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Exaltando seu mérito pessoal diz:
“O presidente do Brasil falou ainda do seu caso pessoal, revelando que “pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado com o vírus, não precisaria de me preocupar”, acrescentando que “nada sentiria ou seria, quanto muito, uma gripezinha ou um resfriado”.
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A naturalização da sobrevivência (física e/ou social) é um componente essencial da retomada das teses “darwinistas” do século 19 e que estão na base tanto do libertarianismo como do neoliberalismo – duas versões do liberalismo contemporâneo. O radicalismo de ambas difere: para os primeiros não deve haver Estado; para os segundos ele deve ser mínimo. O discurso da “responsabilização” emerge em todas as suas políticas.
Por estas versões somos informados que o futuro da humanidade pertence àqueles que se adaptem melhor e, com isso, acumulem mérito. Darwin não era darwinista social, mas outros teóricos se encarregaram de estender suas teses aos domínios humanos. H. Spencer formulou a proposição como segue:
“Durante o resto da sua vida [depois da infância] o indivíduo recebe benefícios proporcionais ao seu mérito, recompensas equivalentes a seus serviços; por mérito e serviços entendemos em um e outro caso a capacidade de satisfazer as próprias necessidades, de procurar alimento, de assegurar abrigo, de escapar aos inimigos. Em competição com os indivíduos de sua própria espécie, lutando com os indivíduos de outras espécies, o indivíduo degenera e sucumbe ou prospera e se multiplica, segundo suas qualidades.
Evidentemente um regime contrário, se pudesse ser mantido, seria com o tempo funesto à espécie. Se os benefícios recebidos por cada indivíduo fossem proporcionais à sua inferioridade; se, por conseguinte, se favorecesse a propagação de indivíduos inferiores e se entorpecera aos mais dotados, a espécie degeneraria progressivamente, e desapareceria logo ante a espécie que competisse e a que lutasse com ela.”(Spencer: O indivíduo contra o Estado, p. 133/4)
Nada mais claro.
A rede bolsonarista já prepara carreatas e publicidade a favor do isolamento vertical – leia-se daquelas pessoas que deixaram de ser “produtivas” e que não devem atravancar o progresso.
Um prefeito bolsonarista em um Estado brasileiro afirma que “morrer todos temos que morrer” e que, portanto, está preparando a suspensão das restrições em sua cidade. É o salve-se quem puder. É o proto-fascismo avançando, calcado na ideia de que o outro pode ser eliminado por não ter acumulado mérito, para favorecer o progresso (no caso, a manutenção do poder). Afinal, “o Brasil não pode parar”.
Toda época de eleições há sempre uma grupo que exalta o bobo da corte, lógico que com o intuito de cobranças futuras, alianças firmadas, entre mortos e vivos, o bobo fica sempre a admirar o espaço físico que encanta sua majestade o bobo.
Professor Freitas, vejo com enorme preocupação a “naturalização” do ensino a distância – EAD. Claro que neste momento de isolamento, essa medida seja cabível para garantir a aprendizagem do estudante, mas não a única. Nem se quer estão sugerindo que pais e responsáveis se dediquem ao estudo com os filhos..A resposta das escolas foi direta. Isso será normatizado com o novo ensino médio e não vejo nenhuma outra proposta a não ser acatar as aulas a distancia. O que vc sugere para nós professores?? abraço
Olá Professor! Obrigada pelo texto/post. Se você tiver algo a dizer sobre essa questão da EaD para a educação básica que alguns estados e municípios estão considerando implementar, por favor publique algo. Várias pessoas e entidades estão se posicionando contra. Há muita ansiedade e incerteza entre os professores no caso de uma volta ao funcionamento das escolas, mas por outro lado há muita preocupação com o calendário letivo.