Ainda a relação educação-produtividade

Samuel Pessoa volta ao tema da produtividade na Folha de São Paulo de 08-02-2015, domingo passado. A volta se dá em termos muito mais cautelosos do que costumeiramente o fez no passado. Há um ano eu o criticava dizendo:

“Samuel Pessoa afirma, por exemplo, que atualmente o desempenho dos estudantes medidos em testes padronizados são o melhor preditor de aumento de produtividade – diz ele: “… a variável importante para determinar a relação entre crescimento econômico e educação não é a quantidade de educação (escolaridade média) mas, sim, a qualidade, medida pelo desempenho de estudantes em provas padronizadas”.”

Aqui há duas afirmações: uma, refere-se à dependência do aumento da produtividade econômica que ficaria na dependência do desenvolvimento da qualidade da educação. E outra, a possibilidade de medir a qualidade da educação através de resultados em testes.

Em relação à primeira, deve-se dizer que os reformadores empresariais tendem a culpar a educação pela baixa produtividade das nações em suas narrativas minimizando os demais fatores que afetam a mesma. Mas há um exemplo clássico de que as coisas não são assim: chama-se Estados Unidos. Como já publicamos aqui, os resultados dos testes padronizados (nacionais e internacionais) dos estudantes americanos não têm nada a ver com a evolução dos índices de produtividade nacional daquele pais.

Na sua nova incursão pelo tema, Samuel afirma que há uma produtividade sistêmica e uma individual e conclui, após admitir que a educação é um fator individual, que ela opera no conjunto dos fatores sistêmicos que produzem a produtividade. Diz: “De qualquer forma, há evidência contundente de que a qualidade da educação importa.” OK. Isso é bem mais razoável de se admitir. Como diz Samuel atualmente:

“A produtividade do trabalho depende de inúmeros fatores. Alguns deles – por exemplo, a educação – são específicos aos indivíduos. Outros são sistêmicos”.

Nisso chegamos a um acordo. Em relação à segunda questão, no entanto, continuamos dizendo que qualidade da educação não é equivalente a resultados de estudantes em testes padronizados, como pensa Samuel. Simplesmente porque média alta em testes (e em apenas duas disciplinas da escola) não é sinônimo de boa educação e a própria economia necessita de outras habilidades não medidas em testes para impulsionar a inovação e a criatividade tecnológica e econômica.

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About Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
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4 Responses to Ainda a relação educação-produtividade

  1. Avatar de Andre Luis Andre Luis disse:

    Bom artigo! Concordo com seus comentários!
    Sem considerar os outros fatores sistêmicos, li artigos que afirmam que existem estudos que dizem que o maior impacto no desempenho acadêmico e profissional viria justamente das inteligências socioemocionais do aluno / profissional, e muito menos do seu nível de QI, que poderia inclusive não ser refletido nos testes padronizados.
    Faz sentido isso para o senhor?

    • Concordo em que há vida inteligente para além do que os testes padronizados conseguem medir. Não sei se os chamaria de inteligência socioemocional. Enfim, prefiro o termo de Levin “habilidades pessoais e interpessoais”. Abraço.

  2. Avatar de Jucirley Cardoso de Jesus Jucirley Cardoso de Jesus disse:

    Olá Professor!
    Em minha dissertação de mestrado abordei a questão dos indicadores gerados pelos sistemas de avaliação externa como único indicador de qualidade e também cheguei a esta conclusão.
    Também usei como referência um artigo no qual o senhor aborda o termo “qualidade negociada” de Ana Bondioli e faz algumas propostas de trabalho considerando esse conceito de qualidade. Há algum texto recente em que o senhor faz essa abordagem? Ainda compartilha das mesma opinião? Gostaria de ler algo mais sobre isso…

    Abraços

    Jucirley

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