Pudemos ver em post anterior a defesa da privatização da educação por “vouchers”, feita pelo Deputado Marcel Van Halten na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, onde ele atua. Separei aquele vídeo para o leitor, porque considero uma boa síntese da ideia do uso de vouchers, feita pelo próprio defensor dela. Isso dá credibilidade à descrição do que esta formulação pretende.
Van Halten aparece neste outro vídeo em um programa com John Stossel, um defensor do livre mercado da direita americana, também associado ao “Students for Liberty” (veja aqui também).
Como vamos assistir este discurso muitas vezes mais por aqui, é hora de esclarecermos um pouco mais esta forma de privatização. A ideia central é a conversão das redes de ensino (públicas e privadas) em um grande livre mercado onde a concorrência elevará a qualidade da educação, a partir da “escolha” da escola pelos pais, subsidiados por dinheiro público (vouchers).
A apresentação feita por aquele deputado expõe as razões pelas quais os conservadores entram em aliança com os liberais pela privatização da educação. A forma preferida dos conservadores é a utilização de vouchers ou de isenção de impostos para matrículas feitas pelos pais em escolas privadas, ainda que não descartem quaisquer outras que diminuam a influência do Estado.
Mas o que devemos destacar na fala conservadora, é esta característica ideológica de preservação do “status quo”, de proteção dos seus filhos contra a ação do Estado que, sempre que for ensinar diferente do que a família pensou, é considerada esquerdizante. No vídeo em que Van Halten está com Stossel, o tema não é a “escolha” e sim como proteger as escolas do comunismo e do socialismo, ou seja, o tema da escola sem partido, sem discussão de gênero, etc. O que busca é uma escola que “blinde” seus filhos e impeça que eles venham a pensar diferentemente daquilo que a família ensinou. Neste contexto, a “escolha” é uma “ação protetora” da família que “escolhe” aquela escola que “blinde” os seus filhos contra a “má influência das ideias esquerdizantes”. Ve-se, assim, a conexão da privatização da escola com a ideologia ultra conservadora da liberdade do indivíduo e da família. Melhor ainda se o ensino for feito em uma “escola” na própria casa do pai.
Para os conservadores, a privatização coloca a escola no “livre mercado” e este é um controlador natural das ideias esquerdizantes. Além disso, pela lógica da concorrência, isso levaria à melhoria da qualidade, pois, as escolas passam a depender dos “clientes” (os quais deixam de ser “usuários” passivos do serviço público) e são estes clientes que estabelecem a relação de pagamento com a escola e não mais a Secretaria de Educação.
Ao deslocar para o cliente o pagamento, ele detém poder para exigir da escola escolhida que ela se comporte de certa forma em relação ao conteúdo ensinado e seus valores. Se não for assim, ele muda de “fornecedor” escolar. Como o dinheiro é concedido ao pai, por exemplo, por isenção de impostos ou por vouchers, ele pode decidir matricular seu filho em outra escola que atenda seus clamores conservadores, debilitando aquela que não o atende: é “natural” que na concorrência algumas sobrevivam e outras não. Sobreviverão aquelas que forem escolhidas pelos pais por estarem atendendo as expectativas destes. O cliente é quem define (e impõe) a qualidade desejada.
Se for necessário, o próprio pai está disposto a complementar a diferença entre o que ele recebe do Estado e o custo final solicitado pela escola. No Chile, a aplicação desta política levou ao “co-pagamento”, ou seja, os pais complementam com seus próprios recursos o que falta para colocar seu filho em uma determinada escola “escolhida”, quando o dinheiro do Estado não for suficiente para tal. É exatamente isso que a atual presidenta do Chile, Bachelet, tenta eliminar na educação chilena, neste momento, pelos efeitos nefastos que lá gerou no aumento da segregação escolar (veja aqui também).
Continua no próximo post.