Postado originalmente na Uol em 12/09/2011
A Folha de São Paulo tem hoje em manchete o assunto do ENEM. Era previsível. Mas a Folha tem se especializado em dizer o que não é possível de ser dito e depois, logo em seguida, para os que continuarem lendo, note bem, dizer o que de fato deveria dizer, mas não disse.
A manchete diz “Rede pública perde espaço entre melhores do ENEM”. Começa a reportagem vaticinando “A participação das escolas públicas entre as melhores do país está em queda [entre os 10% melhores da rede de ensino médio]”. E ao final, vem a informação real: a queda é de 8,4% para 7,9%. Como esta estatística não dá muito ibope, ela arranja um critério adicional: “se ampliada para os 25% melhores a redução é mais acentuada: vai de 20,7 para 15,7%”. Na reportagem na página C9, arruma uma forma de alargar a diferença. Como 5 pontos percentuais podem não impactar suficientemente o público, ela reprocessa a diferença e fala de uma “queda de 24,1%”. Como sempre, os jornais fazem o corte que desejam até encontrar, nas estatísticas, algo a favor de suas teses.
Todos sabemos como funciona. O Editor diz que tem que ser feita uma reportagem mostrando o sucesso ou o fracasso de algo, e o repórter vai olhar e colher os dados desde este ângulo. Triste imprensa a que temos.
Para não passar vergonha, a Folha depois de construir a ideia central – o fracasso da escola pública -, vai abrindo espaço para algumas falas de rodapé.
Felizmente, o Ministro Haddad responde bem. A fala do MEC desmonta o argumento da folha e ela é obrigada a dizer que “Para o MEC, condições socioeconômicas, mais que o trabalho do professor, explicam o resultado”. É a miséria Folha! Ainda que não somente.
A divulgação das taxas de participação por escola, também merece destaque, ainda que, como era esperado, a Folha faça caso omisso dela no seu ranqueamento. Mas não pode deixar de divulgá-la ao lado da nota.
E temos, também, no caderno C9 a divulgação da pesquisa de Francisco Soares mostrando como a inclusão do cálculo de nível socioeconômico altera a posição dos rankings.
É disso que precisamos. De estudos sobre os dados do ENEM com modelos interpretativos diferentes que forcem a abertura de espaço na mídia, mostrando o que se pode dizer de fato sobre tudo isso. Algo que se a mídia não leva em conta, passa vergonha depois – como ocorreu com o jornal Los Angeles Times nos Estados Unidos, jornal que se meteu a fazer um ranking de 6000 professores de Los Angeles e se deu mal.