Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, aparece hoje na Folha falando sobre integração produtiva da América do Sul. Para ele o modelo de desenvolvimento ocorrido durante a época de Lula está exaurido.
Eis aí um ponto em que estamos de acordo, finalmente. De fato, apostar na integração regional – como a Unasul – tem sido uma das marcas dos governos progressistas na América Latina, agora sob fogo da retomada neoliberal (junto com apostar em políticas sociais que agora a oposição diz não caber no PIB e quer abortar, ou seja, quer proteger seu lucro com queda do salário médio e aumento de produtividade).
Nesta entrevista à Folha, que não tem nada a ver diretamente com a Educação ou com o Pátria Educadora, Mangabeira deixa transparecer sua “filosofia da crise como instrumento de transformação”, que bem soube aplicar no início do texto que elaborou para o Programa Pátria Educadora. Lá dizia:
“Nossa situação é dramática. Não há outro país entre as maiores economias do mundo que figura, como figura o Brasil, entre os países com pior desempenho nas comparações internacionais. Oito estados brasileiros têm, pelos critérios utilizados nestas comparações, resultados piores do que o último país nos rankings. No final do terceiro ano do ensino médio, mais da metade dos alunos mal consegue ler ou escrever texto simplório. E só pequena porcentagem alcança em matemática nível considerado internacionalmente aceitável.”
A razão disso aparece hoje na Folha em sua entrevista:
“Se não estivéssemos vivendo uma ou múltiplas crises, não estaríamos considerando alternativas. A maior aliada de quem quer transformação é a crise”.
A tese, em verdade, não é dele, mas de Milton Friedman:
“Só uma crise – real ou percebida – provoca mudanças concretas. Quando a crise acontece, as acções que são desenvolvidas dependem das ideias existentes. Essa, creio eu, é a nossa função fundamental: desenvolver alternativas às políticas existentes, mantê-las vivas e disponíveis, até o politicamente impossível se tornar no politicamente inevitável.”
Como já comentamos neste Blog:
“Foi Friedman quem formulou a tese de que uma pré-condição para ocorrer uma mudança é a existência de uma crise – real ou percebida. Ela tem sido a base de atuação dos reformadores empresariais americanos ao longo de 30 anos.”
A teoria de Friedman permite ampliar a compreensão: ele se refere tanto às reais como às “percebidas” como tal. Vale dizer, ele inclui as crises que, apesar de não existirem realmente, são percebidas dessa forma pelos atores sociais. Neste sentido, elas abrem as portas para a “consideração de alternativas”. Quem produz a crise a ser percebida, já tem a resposta à crise, pois faz parte da própria estratégia.
Foi assim que os reformadores empresariais criaram em 1984 o relatório “A Nation at Risk” nos Estados Unidos, desmontado, infelizmente tarde demais, por Berliner quem mostrou como a tal crise descrita naquele relatório era fabricada. Ver: “The Manufactured Crisis: myths, fraud, and the attack on Americas’s public schools”.
Mangabeira corre o risco de ter seu ministério extinto na reforma de ministérios que se aproxima, ou pelo menos ser anexado a alguém. Não penso que faria muita falta já que seu Ministério se superpõe à ação dos ministérios que tratam de quase todos os assuntos que ele também trata. Vimos isso com clareza por conta da intervenção da SAE nos assuntos educacionais com o texto sobre o Pátria Educadora, onde ele vai muito além de uma recomendação de estratégia para tentar definir até como o professor deve dar aulas na escola.
Mas mesmo em sua preocupação com a estratégia de projetos de integração regional, Mangabeira continua tratando questões educacionais:
“Com o Equador, criar um novo modelo de escola média técnica capaz de priorizar a capacitação exigida pelas novas tecnologias. (…) No Chile, o foco foi educação e o desenho institucional propício ao fomento de empresas de vanguarda”.
Quem está “ensinando” quem (Brasil ou Chile, Brasil ou Equador) não ficou claro.
Bem interessante sua análise, Professor, sobretudo quando vincula a “fala” do Mangabeira Unger, na Folha, ao princípio do Friedman. Foi nesse mesmo sentido que, à época das inundações de Nova Orleans, Friedman, já com a saúde debilitada, encontrou um momento para escrever um editorial no Wall Street Journal no qual dizia que a maior parte das escolas de NOva Orleans estava em ruínas, “assim como os lares das crianças que estudavam ali. As crianças agora estão espalhadas por todo o país. Isso é uma tragédia. É também uma oportunidade para reformar radicalmente o sistema educacional”. Além desse trecho, outros de igual natureza, são analisados por Naomi Klein, em “A Doutrina do Choque – a ascenção do capitalismo de desastre”.
Tem razão. Estou preparando uma matéria sobre New Orleans, logo mais circularei. Abraço.
Professor no dia 11 de setembro às 14h30 estaremos na Alesp, numa audiência pública solicitada pelo Deputado Carlos Giannazi em nome do Movimento em Defesa das Ciências Humanas. Estamos muito preocupados com a Reforma do Ensino Médio que virá, na Alesp o pl 1083/15 já anuncia na Meta 22 a reforma. A sociedade civil não foi ouvida, não sabemos o que o Estado de São Paulo fará com a lei federal 11.684/08 que garante à obrigatoriedade da sociologia e filosofia no Ensino Médio, na medida em que as áreas de conhecimento tendem a serem facultativas, deste modo como fica a obrigatoriedade garantida em lei? vamos debater este tema no Plenário José Bonifácio, todos estão convidados.