A entrevista de Mercadante

Com obviedades do tipo “a educação não pode parar em tempos de crise” ou frases como “ou o Congresso se debruça sobre o financiamento da educação ou não adianta dizer para repassar o recurso que nós não temos”; “temos que fazer mais com menos” e outras, Mercadante dá entrevista onde continua sua trajetória confusa pela educação. Depois de comentar o lançamento do portal “A hora do ENEM”, uma plataforma para “treinar estudantes para a prova”:

“O Ministro falou também sobre a necessidade de uma lei que regule as greves de professores: “É um direito, mas não podemos ter greves prolongadas que prejudiquem o processo de aprendizagem”, disse.”

A fala dele é idêntica à de Samuel Pessoa na Folha de São Paulo, o coordenador da campanha de Aécio Neves para quem é preciso:

“votar lei de greve de servidor que proteja os interesses dos cidadãos”.

Mercadante não percebe que a lei de greve será usada na fase pós-golpe para calar uma das áreas em que haverá resistências às políticas neoliberais, ou seja, o serviço público. Isso porque suas “teses” já estão se igualando tanto àquelas, que ele já não consegue mais distinguir. É o que também mostra o trecho seguinte de sua entrevista. O Ministro:

“defendeu mais investimento para a educação básica e sugeriu a criação de um fundo de contribuição de ex-alunos de universidades públicas. “O aluno sai, se depois teve êxito, se é de uma família que tem posses, por que ele não pode contribuir para a universidade que ele estudou de graça? Em modelos internacionais, há universidades que se financiam principalmente com essa iniciativa, precisamos criar essa cultura. Esse fundo seria gerido pelos conselhos universitários, portanto só pode ser aplicado naquilo que a legislação estabelecer e é uma gestão pública desse recurso.”

Mais ainda:

“Eu sou totalmente favorável a essa recomendação do Congresso Nacional de que na pós-graduação lato sensu você cobre pelo curso. Um profissional que já está formado e vai ter especialização, por que ele não paga, ajudando inclusive a financiar a bolsa de estudo daqueles que não podem ficar na universidade?”.

Lamentável. A entrevista poderia ter sido interessante a julgar pelo posicionamento do Ministro em relação à privatização do ensino:

“Agência Brasil: O que o senhor acha sobre a transferência da gestão de escolas públicas, por exemplo, a organizações sociais?

Mercadante: É possível ter bons modelos de gestão dentro de uma visão de escola pública. O modelo de voucher [que permite que dinheiro público seja usado para pagamento de matrículas em escolas particulares] que, no fundo, é o que está por trás, começou lá no final dos anos 50, 60, nos Estados Unidos. Só 3% da rede americana foi nessa direção. Não há nenhum estudo acadêmico que diga que isso melhorou a educação. A educação é universal. Nos países que têm os melhores sistemas de educação, a escola é pública. Toda a rede tem que ter qualidade, precisamos inovar, melhorar a gestão, por isso a formação de professores, por isso esses novos instrumentos, mas eu não acho que privatizar a gestão vá resolver o problema da qualidade da educação.”

E nisso ele está correto. Embora o Ministro confunda terceirização de gestão com voucher, que é outra forma de privatização, ele generaliza sua crítica contra processos de privatização. Valeu, neste caso, pela reafirmação da educação pública.

Este é o zig-zag do governo Dilma e seus ministros.

Avatar de Desconhecido

About Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
Esta entrada foi publicada em Escolas Charters, Privatização. Adicione o link permanente aos seus favoritos.

2 Responses to A entrevista de Mercadante

  1. Avatar de Maria Estela Sigrist Betini Maria Estela Sigrist Betini disse:

    Um exemplo do PT que não queremos.

  2. Avatar de Guilherme Guilherme disse:

    Olá professor, tem conhecimento disso?

    http://www.rebelion.org/noticia.php?id=210989

Deixar mensagem para Guilherme Cancelar resposta