Será o Ceará o nosso Texas? Sim.

Em setembro de 2016 perguntei em um post: Será o Ceará o nosso Texas? A resposta chega agora em reportagem da Folha, indicando que o modelo será adotado pelo MEC e por alguns estados. Na época escrevi:

“Com a ênfase em “bater metas” no Ideb, as escolas de “sucesso” serão aquelas que treinarem os alunos para se sair bem nas provas de matemática e português. Uma total inversão dos objetivos da formação humana. Esta é a “filosofia educacional” que deverá se fortalecer no país. O atual governo deverá estabelecer incentivos para isso também, agravando mais ainda a “corrida para nenhum lugar”.

Os municípios e estados que quiserem ser bem sucedidos deverão ter um controle cada vez mais rígido sobre o que se faz em sala de aula e adicionar um conjunto de provas intermediárias que farão o monitoramento da “aprendizagem” do aluno e o ensinarão a ir bem nas provas. O que importa é a média subir – por bem ou por mal. O exemplo mais claro disso é Sobral no Ceará. Isso irá tornar o magistério ainda mais desestimulante e o estudante em alguém doente, estressado.

O Ceará colocou o desenvolvimento educacional dos municípios como parte das condições de partilha do ICMS estadual. Isso certamente está gerando competição e um controle intenso no interior das redes e escolas, via avaliação. Pelas regras de distribuição, 25% do ICMS é repassado aos municípios em função de resultados em educação, saúde e meio ambiente. No caso da educação, cabe a ela 18% deste valor, assim dividido: 12% baseado na avaliação da alfabetização dos alunos na 2a. série do EF e 6% baseados no índice de qualidade educacional dos alunos da 5a. série do EF. A avaliação do fundamental I, anos iniciais, portanto, define parte do ICMS recebido pelo município. Além disso, distribui-se 25 milhões de reais em meritocracia.

A que pressões estão sendo submetidas as redes públicas do Ceará? Já que o modelo deverá ser imitado, eis aí um bom tema de pesquisa. Como as redes estão respondendo a estas pressões para garantir as metas? Há efeitos colaterais? A regra de distribuição do ICMS e da meritocracia nutrem a crença de que os problemas de desigualdade escolar são intrínsecos à escola, quando sabemos que, além dos intrínsecos, mais de 60% das variáveis que afetam o desempenho do aluno na escola estão fora da escola, na vida ou nas características pessoais dos estudantes.”

A resposta a esta questão feita em 2016 chega agora na reportagem da Folha de São Paulo: “MEC quer condicionar repasse para estados a resultados na educação”. Modelo inspirado pelo Ceará foi adotado por Pernambuco e está em estudo pela gestão Doria e por mais 2 estados.

Leia aqui.

Para entender o que vai acontecer, basta tomar como referência Sobral, no Ceará, também considerada modelo pelos reformadores empresariais.

Leia aqui.

Também nos Estados Unidos, talvez por outros motivos, houve o “milagre do Texas” (veja abaixo) e serviu para impor a geocultura meritocrática para todo o pais através da lei No Child Left Behind, uma lei que, para se constatar seu fracasso na elevação da qualidade da educação, levou 14 anos, até ser substituída por outra. Seu sucesso não se mede pela qualidade que implementou, mas pela eficácia em promover a privatização da educação americana.

George Bush (filho), ao assumir a presidência, implantou esta lei em 2001, gabando-se de sua atuação como governador do Texas. Ele aplicou antes em seu estado, quando era governador, os princípios da No Child Left Behind. Apresentou “resultados” para convencer democratas e republicanos a embarcar na lei. Mas logo o “milagre do Texas” seria desfeito. Mas não antes de que a lei fosse aprovada. No link abaixo, você pode conhecer um pouco desta história. Abaixo, uma das conclusões:

“As pontuações no teste do Texas subiram, mas no SAT para estudantes universitários potenciais caíram. Os pesquisadores descobriram que os testes do Texas projetados pela Pearson mediam principalmente a habilidade de fazer testes. Apologistas escolheram a dedo as pontuações do National Assessment of Educational Progress  para mostrar o progresso, mas no geral o Texas perdeu terreno para o resto do país, como mostrou o Dr. Julian V. Heilig, um pesquisador em educação da Universidade do Texas. Mas aí já era tarde demais. O Milagre do Texas, miragem ou não, era a lei da terra.”

Leia o texto completo aqui e aqui.

Vale lembrar também que há uma “lei de responsabilidade educacional” empacada no Congresso.

Sobre Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
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