Cain e Laats: Escola Zoom?

Para os que já estavam em contato com a chamada “tecnologia educacional” dos anos 70, que se seguiu à era dos “audiovisuais”, não há nenhuma novidade na proclamação dos atuais entusiastas do ensino híbrido. As promessas, não realizadas naquela época, são as mesmas: a tecnologia causará uma mudança dramática nas escolas e permitirá a elevação da qualidade a menores custos. Onde entra a tecnologia, empregos são eliminados como forma de compensar os gastos em tecnologia – diz a lógica empresarial.

Em 1972 assisti, em um congresso de educação no México, uma das sessões na qual a grande novidade promissora era a revolução educacional da “Instrução assistida por Computador”.

O expositor, no clímax de sua exposição, usando um telefone (ainda com tecnologia analógica) “discava” para os Estados Unidos e uma lição auto-instrutiva passava a ser exibida na tela do Congresso, no México – para encanto, surpresa e deleite de todos.

Abria-se, pensávamos, uma nova era em que a presença interativa de um professor para realizar a aprendizagem era agora apenas acessória: o foco era o comportamento do aluno frente à tela e o professor passava a ser visto como se fosse mais uma “interface” acoplada a um sistema cientificamente preparado e que poderia ser ou não “plugado” a este na medida da necessidade.

O que passava a ser importante, era a preparação do sistema instrucional pelos especialistas que analisavam as habilidades esperadas dos estudantes e, por uma análise e sequenciamento científico, determinavam o caminho a ser seguido para a aprendizagem eficaz – com a vantagem de que ele podia prever e antecipar os erros mais prováveis dos estudantes, determinados pela análise das habilidades e pelos testes de campo, permitindo ter, on line e de imediato, a necessária instrução corretiva a tais erros – o tal “feedback”. Com uma pálida imagem do que deveria ser a relação professor-aluno, houve até quem previsse que o professor passaria, então, a ser apenas um “mestre de cerimônia” destinado a animar a festa da aprendizagem.

Muita gente ganhou dinheiro com isso, mas nunca se soube que aquelas proclamações tivessem conduzido a uma revolução na educação – não pelo menos que impactasse a maioria das redes de ensino. Esconderam o fracasso na falsa acusação de que “a educação é contrária à tecnologia”.

Cinquenta anos depois, as promessas de uma revolução pelo ensino híbrido e pela educação à distância voltam.

No âmbito do nosso sistema social, há uma fixação (muito conveniente para alguns que faturam com ela) de que uma mudança revolucionária na educação só pode ser conseguida por adição de tecnologia. Como dizia um psicólogo famoso naquela época; “não há razão para que uma sala de aula tenha menos tecnologia do que uma cozinha”.

Como as finalidades educativas da escola atual se limitam a estreitas perspectivas de formação registradas em bases nacionais comuns, a adição de tecnologia se vê facilitada em seu desenvolvimento e também comercialização, afinal, agora a BNCC vale para todo o pais, criando um mercado com escala nacional, o que viabiliza altos investimentos na elaboração de plataformas on line de ensino. O tecnicismo descrito, por Saviani, como a preponderância dos processos, métodos e técnicas sobre os professores e estudantes, está de volta na política pública.

O atual entusiasmo está alavancado, como sempre, pelos novos desenvolvimentos tecnológicos. Isso não é muito diferente da época do aparecimento da televisão, dos audiovisuais e depois com a associação da aprendizagem aos nascentes computadores da década de 70. Cada novo desenvolvimento tecnológico leva ao ressurgimento destas promessas: “agora será diferente”, temos “tecnologia interativa”, todos têm “acesso a celulares” – e por aí vai.

O que é que não foi aprendido destas experiências passadas?

Vitoria Cain e Adam Laats respondem em um artigo no Washington Post (onde passam revista aos desenvolvimentos tecnológicos que motivaram o mesmo solucionismo tecnológico em outros tempos), e concluem apresentando a lição que já deveríamos ter aprendido:

“A tecnologia pode ser uma ferramenta para professores e alunos, mas não pode substituir o papel de um professor humano preparado e engajado. Como os pais passaram a apreciar durante a pandemia, o ensino presencial inspira os alunos muito mais do que a escola Zoom jamais o fará. Pessoalmente, os professores se conectam e se envolvem com os alunos de maneiras que as telas simplesmente não podem reproduzir.”

Leia aqui.

Infelizmente, a Educação é uma área povoada por estas ideias que nunca morrem e nunca funcionam.

Sobre Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
Esse post foi publicado em Responsabilização/accountability, Segregação/exclusão e marcado , , . Guardar link permanente.

2 respostas para Cain e Laats: Escola Zoom?

  1. Marlon Eij disse:

    Ótimo artigo professor! Essa história de que as ferramentas tecnológicas podem solucionar os problemas da educação é papo pra boi dormir. Mas, penso que diferentemente do período dos anos 70, as condições atuais de organização da sociedade permitem com que se instale nas escolas o ensino hibrido, principalmente nas escolas de periferias, onde faltam professores.

Deixe um comentário