Um novo rumo para a educação chilena

Com a eleição de um presidente comprometido em colocar um fim à era neoliberal, novos rumos podem ser vislumbrados para a educação chilena. O trabalho já havia sido iniciado em governos anteriores como o de Bachelet, mas agora pode ganhar novo impulso.

Destacamos os seguintes pontos no programa de Gabriel Boric, novo presidente eleito do Chile, com o objetivo de confrontar a reforma empresarial e a privatização que o sistema sofreu desde a ditadura de Pinochet e colocar a educação em outro rumo.

Logo na abertura do programa para a educação o documento informa sua intenção geral dizendo que “a educação de que as novas gerações precisam não pode mais ficar presa à elaboração de provas padronizadas, a um ensino mecânico e pouco estimulante, a um sistema muito desigual.” Em contraposição se propõe desenvolver “uma abordagem abrangente da educação que desenvolva a criatividade e o pensamento crítico, prepare as pessoas para viver em comunidade e permita a implantação da diversidade de projetos de vida, colocando as artes, os esportes, o bem-estar e o desenvolvimento humano no centro. do processo educacional.

No ensino básico, entre outras ações, destacamos a proposta de substituir o “sistema de avaliação nacional com enfoque em provas padronizadas, controles e sanções, por um sistema de apoio com sentido formativo, sem consequências associadas aos resultados da aprendizagem, voltado para a profissionalismo docente, a melhoria contínua e a aprendizagem integral.” A era da responsabilização verticalizada e unilateral exercitada à exaustão em vários países não gerou melhor educação e, neste sentido, o documento incorpora uma visão mais moderna sobre a avaliação.

Além disso, é firmado o compromisso já iniciado pelo governo Bachelet de continuar “a retirar a dinâmica do mercado da educação” propondo para isso “um novo sistema de financiamento público dos estabelecimentos de ensino, que não se baseie na promoção da concorrência, mas na garantia do direito a uma boa educação” reforçando, assim, o término do “lucro na educação subsidiado pelo Estado”.

O documento ainda se propõe a reforçar “o papel dos professores e assistentes pedagógicos, melhorando as suas condições de trabalho”; criar “em um processo de diálogo (…) uma carreira para gestores de estabelecimentos do setor público”, implementando também “um processo de reparação da dívida histórica dos professores (a ser implementado durante o mandato de governo, a começar pelos professores mais velhos)”.

Da mesma forma, propõe acabar com “a dupla avaliação docente” e promover “uma cultura do trabalho escolar que se baseia na profissionalização docente coletiva, reforçando o trabalho entre pares, a autonomia profissional e o Conselho de Professores, e combatendo práticas que desprofissionalizam e sobrecarregam os alunos.

No ensino superior a proposta passa por viabilizar o “perdão universal de dívidas de estudantes” que agravou a dívida estudantil à medida que houve “o aumento da comercialização e privatização do ensino superior” criando “uma mochila pesada para os devedores da educação e um peso elevado para o Estado, que até à data já recomprou mais da metade dos empréstimos concluídos.” O documento propõe o “cancelamento universal das dívidas educacionais por meio de um esquema de pagamento de longo prazo por parte do Estado, onde o gradualismo é apoiado por instituições financeiras e não por pessoas endividadas” e sua substituição por “um novo sistema único de crédito que será transitório, até atingir a gratuidade universal. Será público, solidário, sem juros, sem a participação dos bancos”.

Finalmente, destacamos o compromisso com a “reconstrução e expansão da educação pública gratuita e de qualidade” iniciando “um processo de reconstrução e expansão da educação pública” que envolverá o aumento do financiamento de base às instituição estatais e à proposição de “um processo de expansão das suas matrículas, através de um crescimento sustentado desta nos próximos anos, o que permitirá a médio prazo que a maioria dos alunos possa optar pelo acesso ao ensino público.

Leia aqui toda a proposta.

Novamente cabe alertar para os rumos que a educação brasileira tem tomado: estamos na contramão da “evidência empírica” que os países que passaram por estas políticas, copiadas também no Brasil, têm gerado. Se continuamos por este caminho, ele só significará mais décadas perdidas.

Um programa que oriente a ação da esquerda para o próximo governo a ser eleito em 2022 no Brasil, não pode ignorar esta experiência acumulada pelo Chile. Afinal, ele não foi o laboratório delas? Então, deu ruim por lá…

Sobre Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
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