Por que critico a CNTE – II

Postado originalmente na Uol em 6/07/2011

Na postagem anterior mostrei como a CNTE por um lado afirma que não está perfilada com o governo Dilma e, por outro, é apoiadora do MEC no que se refere à organização do ENEM dos Professores, para citar um exemplo. Aliás, um leitor atento me chamou a atenção para o fato de que a própria CNTE, em seu “press release” assume o ENEM dos Professores como “avaliação”. Veja:

“O evento teve como base um documento elaborado pelo Comitê com os eixos de conhecimento e de processos que terão que ser incluídos na avaliação (…). A criação da Prova Nacional de Concurso para o Ingresso na Carreira Docente foi publicada no Diário Oficial no dia 3 de março deste ano. Ela subsidiará a contratação de docentes para a educação básica das unidades da Federação e Municípios que aderirem à avaliação”.

A CNTE tem dado boas lutas. É o caso da luta pelo Piso Salarial. Não negamos isso e nem seu passado histórico. As críticas não são motivadas por desavenças em relação a espaços políticos. Deixei o PCdoB há mais de 10 anos, por razões que hoje estão mais claras para todos os que acompanham os noticiários políticos. Não atuo em nenhum partido político desde então. Também não atuo em outra organização sindical que tenha divergências com a CNTE. O que nos preocupa é que ela não traça um programa de lutas nacional contra os reformadores empresariais da educação que estão se mobilizando para influenciar o governo Dilma.

O Movimento Todos pela Educação está a pleno vapor reunindo as viúvas da campanha do Serra, os reformadores empresariais e ele próprio na difusão de suas ideias atuando, preferencialmente, sobre as Secretarias de Educação dos Estados e dos Municípios. Daí que o ENEM dos Professores tenha sido proposto e hoje é francamente apoiado pelo Consed e pela Undime – que reúnem tais Secretários. A CNTE está no mesmo barco, apoiando as teses do Consed e da Undime no que se refere ao ENEM dos Professores. Fez algumas sugestões menores de mudança, mas acabou escondendo-se atrás das entidades científicas (Anpae, Anped, Anfope, Cedes). Mas, o que pensa a CNTE sobre o ENEM dos professores? Mais ainda, o que tem feito a CNTE contra este exame? Nada.

E isso é o outro ponto a comentar na posição da CNTE. Segundo ela:

“No período de 8 a 10 de junho ocorreu, em Buenos Aires, a 8ª Conferência Regional dos Trabalhadores em Educação, promovida pela Internacional da Educação através de seu escritório regional para a América Latina (IEAL). E um dos principais temas abordados referiu-se ao enfrentamento dos sindicatos nacionais aos critérios de gerenciamento empresarial sobre as políticas e a gestão da educação pública, bem como às concessões do Estado à iniciativa privada por meio da reserva de mercado em várias etapas e níveis escolares.”

 Ora, não estamos falando de participar de congressos internacionais e afirmar posições teóricas. Estamos falando de dar uma luta aqui, no Brasil, afinal o MEC fica apenas há algumas quadras da sede da CNTE. Quais as lutas que estão sendo concretamente levadas pela CNTE em relação ao ENEM dos Professores, em relação à posição gerencialista do governo Dilma que afeta a educação, em relação ao Movimento Todos pela Educação, em relação à reforma administrativa do MEC que o prepara para apoiar organizações não governamentais com ou sem fins lucrativos? Em relação ao pagamento de bônus para professores que está sendo ampliado nos Estados e que corrompe a carreira dos profissionais da educação? Em relação à pseudo campanha de valorização do professor que está sendo montada pelo Movimento Todos pela Educação e que prepara o terreno para culpabilizar professores e justificar a meritocracia dos bônus? Em relação ao credenciamento de gestores da educação que avança pelas mãos de Guiomar Namo de Melo e outros órfãos de Serra.

Caso típico é o Pronatec. A CNTE fez uma boa análise teórica da inadequação do Pronatec enquanto um mecanismo de distribuição de dinheiro público para a iniciativa privada. Mas, e daí? O que fez a CNTE para denunciar, lutar, formar opinião contra o Pronatec?

Na questão do ENEM dos professores, esconde-se atrás das entidades científicas. Na questão da reforma do MEC, são omissos. Em relação ao PNE escondem-se atrás da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e sequer enfrentaram o MEC quando ele enfiou as deliberações da CONAE debaixo do tapete e as omitiu na formulação do seu PNE. É óbvio que o PNE do governo não levou em conta a CONAE promovida por ele mesmo. Ou seja, não há embate direto da CNTE com as políticas públicas educacionais equivocadas do governo Dilma que estão abrindo as portas do governo aos reformadores empresariais.

A raiz do problema é uma só: a CNTE tem dificuldades para criticar um governo do PT. Está sendo leniente com o governo Dilma num momento crucial das políticas públicas educacionais quando estas estão sendo assediadas pelos reformadores empresariais que têm trânsito no governo Dilma – até mais do que a própria CNTE.

Num quadro deste, a CNTE ainda acha tempo para me criticar. Eu estou onde sempre estive, desde que criticava o governo Fernando Henrique Cardoso. Não participo da tese: “esqueça tudo que falei ou escrevi”.

Sobre Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
Esse post foi publicado em Assuntos gerais, Avaliação de professores, Fernando Haddad no Ministério, Postagens antigas da UOL, Responsabilização/accountability e marcado . Guardar link permanente.

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