Autonomia do INEP

Circulou pela internet uma carta dos funcionários do INEP pedindo a autonomia do órgão. Em meio ao segundo turno das eleições, fez coro com o debate da autonomia do Banco Central. E portanto, foi visto pelo mesmo ângulo. Mais ainda, foi confundido com eventuais manobras para esconder dados em período eleitoral por parte do governo. Nada mais inadequado para o real debate sobre o futuro do INEP.

A autonomia não é o maior problema do INEP. O grande problema é que ele se converteu em um administrador de provas terceirizadas. Não faz estudos e pesquisa como o nome pede. Nem sequer tem um relatório decente sobre as avaliações que administra e que são feitas por terceirizadas. Dedica-se desde Fernando Henrique Cardoso a ser um enclave destinado a propagar e aplicar as teses da responsabilização – com variações de ênfase apenas. No passado houve uma presidenta do orgão que até tentou devolvê-lo aos trilhos, durou pouco.

Ao solicitar a autonomia do INEP, seus servidores ocultam os reais problemas do órgão e não perceberam (creio eu) que podem estar engrossando o caldo pela privatização do INEP. E por não ter explicitado todas estas confusões, sou contra o teor simplista da proposta.

Mesmo a desejada autonomia precisa ser qualificada. No caso do BC, a autonomia é reivindicada para colocar o Banco Central sob controle da iniciativa privada para que, independentemente da política do governo, seja feito o que o mercado quer. Não vejo diferente uma eventual autonomia do INEP. E isso me parece inadequado pois o INEP, mesmo com o que restou dele, deve estar inserido em uma política educacional e não ser autônomo para, ao arrepio do MEC, fazer sua própria política educacional “ad hoc”. Se deixar, o INEP vira um órgão ligado à presidência da república, como no Chile.

Os processos de avaliação não são centrais quando se pensa a questão da organização global do trabalho pedagógico da escola – ao contrário, são subsidiários. Já vimos recentemente o INEP querendo definir até mesmo o currículo nacional, quando tal responsabilidade é da Secretaria de Educação Básica do MEC.

Finalmente, quanto à questão da divulgação de dados de provas, penso que faria muito bem se o INEP parasse de vez de divulgar dados sobre avaliação que não fossem genéricos, ou seja, desagregados até um nível em que não se pudesse identificar as escolas (redes de ensino, por exemplo, como nível máximo de desagregação dos dados). Defendo mesmo que as avaliações sejam feitas amostralmente.

A instituição da avaliação censitária foi uma vitória dos defensores da teoria da responsabilização da escola e do professor que acreditam que tornar público o desempenho das escolas melhora a qualidade da educação. O então presidente do INEP, ao defender a versão censitária, argumentava que nos Estados Unidos, naquela época no auge do No Child Left Behind, só dos estados americanos terem que fazer avaliação já se tinha melhorado a educação naquele país. Ele não sabia a que levaria toda esta ênfase americana na avaliação: à destruição do sistema público de educação e à estagnação daquele país nos exames nacionais e internacionais.

Portanto, não vejo problema em não divulgar dados que identificam escolas. Gostei mesmo que a ANA não tenha sido bombasticamente divulgada até agora pela imprensa com seus habituais ranqueamentos. Tomara que continue assim.

A questão central não é garantir a divulgação independente dos dados das provas, mas diminuir sua quantidade e evitar seu caráter censitário. Sendo amostral, garantimos os mesmos benefícios da avaliação para efeito de monitoramento da política pública e evitamos os ranqueamentos desnecessários.

É falsa a ideia de que a escola ou o professor não sabem quando os alunos não vão bem. Ninguém melhor do que o professor conhece seus alunos e nunca uma prova poderá fornecer a ele um quadro melhor do que aquele que ele tem acompanhando o aluno diariamente. Não é conhecimento da realidade que falta ao professor, são as condições para ele atuar nas soluções destes problemas em sua realidade específica. Comunicar a ele o que ele já sabe, não resolve o problema da falta de condições. Ao contrário, agrava, pois vem acompanhado de pressão pela solução na ausência de tais condições.

Sobre Luiz Carlos de Freitas

Professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - (SP) Brasil.
Esse post foi publicado em Assuntos gerais. Bookmark o link permanente.

2 respostas para Autonomia do INEP

  1. Sonia Regina Pereira disse:

    Concordo plenamente. Não podemos deixar retroceder nas questões que devagar começam a caminhar positivamente. Desde quando os profissionais dos órgãos públicos não tem competência? Tem é que mostrar as suas competências. Vamos em frente para que realmente ande, e que não deixem empresas privadas fazerem o que bem entendem, com profissio ais qua nem são da educação, negociarem a educação. Que é isto que eles visualizam.
    “A EDUCAÇÃO NÃO É NEGÓCIO OU MERCADOLOGIA”!…

  2. Pingback: Resposta a Luiz Carlos de Freitas | Servidores do INEP

Deixe um comentário